EVANGELHO Mt
23, 13-22
«Ai de vós, guias cegos!»
Hoje meu Deus,
Me assaltas com teus ensinamentos,
Nos dais indicações, orientações,
De como educar,
De como orientar,
Não dando espaço,
Para que fariseus,
Escribas e hipócritas,
Corrompam o coração dos nossos filhos,
Ai de nós, guias cegos pela liberdade,
Que abandonamos os jovens,
Há imaturidade, a ouvir,
Doutrinas corrompidas,
Duma salvação deturpada!
Ai de nós guias cegos,
Se não te escutarmos!
Palavra da salvação.
OS HIPPIES
DA SHARIA
Ela tem 22 anos, adoptou o nome de Khadijah Dare e é de Lewisham, Londres. Ele
acolheu o nome de Abu Bakr e é sueco. São casados, ambos combatem pelo ISIS e
vivem com o filho pequeno em Raqqa, a capital do Califado.
O sonho dela é ser a primeira mulher a decapitar um "terrorista" dos
EUA ou Reino Unido (como o James Foley, segundo afirma no Twitter).
Convertida durante a adolescência, vive aquilo que chamamos de radicalismo
islâmico, que não é, nem mais nem menos, que viver em rigor sob os ditames da
Sharia, a Lei Islâmica, mantendo aceso o fogo sagrado da Jihad de a impor a
cada ser humano do planeta. E apenas isso.
Para muitos um bicho-de-sete-cabeças, que evoca açoites e chicotadas,
apedrejamentos, amputações e execuções, a Sharia, baseada em tradições muito
anteriores ao Islão, é, na verdade, uma resposta pragmática, simples e eficaz,
a muitos males que assolam a sociedade ocidental.
Por exemplo, um marido traído numa comunidade ocidental machista, pode
eventualmente carregar esse estigma durante anos, ser apontado a dedo ou
referido em sussurro, com toda a dificuldade que acarreta a construção dum
futuro com tal fardo. Com a Sharia, nada disso acontece: toda a comunidade
participa na punição da "traidora", duma forma tão violenta e
traumática para todos que ninguém mais refere o facto, abrindo assim caminho
para o construção do futuro do ofendido. Uma pedra sobre o assunto,
literalmente.
Uma sociedade regida pela Sharia não tem assaltos ou crime violento. As
punições são tão severas que ninguém se atreve a roubar seja o que for, em que
circunstâncias for.
Numa sociedade regida pela Sharia, ninguém perde o emprego, destrói um
casamento, vai preso por cometer um crime de agressão, mata na estrada, ou faz
figuras tristes, quer na rua, quer na internet, por beber demais. O álcool é
proibido. Ponto final.
Não se vêm drogados. A droga é completamente proibida e as punições físicas são
atrozes, como as do álcool.
Estes são alguns exemplos duma filosofia simples... Algo como cortar a cabeça
para lhe passar a dor.
É claro que existem punições horríveis para actos que fazem parte da nossa
normalidade, como uma mulher andar sozinha (sem um familiar), ou mostrar as
pernas, ou o cabelo, ou fazer propaganda a Jeová porta-a-porta, ou tomar um
refresco com um amigo numa esplanada, ou conversarem num carro a fumar um
cigarro. As violações com base na lógica do "estavas a pedi-las, ao não te
comportares segundo os preceitos islâmicos" são punidas de forma leve. A
pena da violada costuma ser pior que a dos violadores.
Mas, para os adeptos, estas coisas fazem parte. Para eles é muito pior estarem
no meio do trânsito e levarem um tiro e ficarem sem o carro ou saírem dum banco
e levarem três. Ou a prostituição, ou isto, ou aquilo... É o que alegam.
É impressionante a quantidade de jovens ocidentais que se têm juntado à Jihad
do ISIS. Semanalmente aparecem relatos de jovens que fogem da casa dos pais
para isso. E inúmeras raparigas, como a londrina acima mencionada. Muitas
espanholas e inglesas. E rapazes, de todas as nacionalidades. Ainda hoje soube
de um belga com apenas 13 anos... Treze anos, no norte do Iraque, de Kalashnikov
em punho, para matar infiéis. Os portugueses sabem que andam por lá onze dos
seus. Um deles martirizou-se no outro dia ao carregar contra uma esquadra de
polícia ao volante de um monovolume carregado de explosivos.
Austrália, EUA, Suécia... adolescentes e jovens que chegam, de todo o mundo,
aos milhares para abraçar esta Jihad.
Porquê?
Não deve existir altura na vida de alguém em que a vontade de mudar o mundo
seja maior que na adolescência. É a altura de colocarmos tudo em causa: a vida
dos nossos pais, na qual identificamos um futuro que para nós não queremos. O
mundo que a geração deles faz gestão, um mundo que não gostamos. A forma como
eles o vêem, que contestamos.
Queremos mudar tudo, e precisamos de pistas, linhas-mestras. Numa altura em que
não temos grande conhecimento técnico dos mecanismos da vida, começamos a
acreditar que existam fórmulas mágicas para mudar o mundo.
Foi assim à volta de Woodstock. Foi assim com a geração do Flower Power.Todos
os outros, excepto os nossos pais, tinham razão. Se os nossos pais eram de
direita e conservadores, nós éramos de esquerda e comunistas. Se eram cristãos,
nós éramos budistas, ou hinduístas, ou seguíamos um Guru Marahiji qualquer e
fazíamos viagens à Índia, ou ao Nepal.
Sempre em busca dum novo rumo para aquilo que sabíamos estar mal.
Hoje, na segunda década do Século XXI, o fenómeno repete-se.
Só que hoje, todas as fórmulas antes tentadas, falharam. Nada resultou.
Comunismo, Capitalismo, Gurus, Dalai Lama. Nada disso resolveu os males do
Mundo. Os pais são exemplo disso: escravos das dívidas, alcoólicos,
desrespeitados pelas mulheres, desrespeitadas pelos homens, todos a traírem
todos. Deixaram de acreditar naqueles deuses coloridos e agora não acreditam em
nenhum, nem na vida depois da morte, nem no futuro do planeta, nem no dos
filhos, que nele andam à deriva...
É para muitos destes adolescentes e jovens, que o Islão se revela uma resposta.
Mas não o Islão espiritual. Esse, o da oração e contemplação, é muito
semelhante a outras fórmulas tentadas. A resposta, eles buscam-na e
encontram-na na magia do Islão Guerreiro, primordial, o do Profeta que, à
semelhança do ISIS, andava de cidade em cidade a matar infiéis e a converter, a
cargas de cavalaria ligeira – hoje motorizada– com a bandeira de Allah a
esvoaçar no azul quente do céu do deserto.
É na Sharia, esta fórmula simples e decisiva de resolver os males do mundo, que
eles se revêm.
Antes, viajavam para a Índia e o Nepal em busca de pistas para o seu futuro.
Hoje, viajam para a Síria para o construírem.
E ele nasce, violento, à sua frente.